1973 | BRASIL | 85 min
24 A 26 SETEMBRO
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OS HOMENS QUE EU TIVE
(Tereza Trautman)


Pity leva uma vida alegre com seu marido Dode e seu namorado Sílvio. Ela procura entender seus próprios desejos e buscar formas de saciá-los.



26 SETEMBRO | 18H
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DEBATE
com Roberta Veiga
mediação de Amanda Devulsky 

Roberta Veiga
Roberta Veiga é doutora em Comunicação pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), professora adjunta do Departamento de Comunicação e do Programa de Pós-Graduação (PPGCOM-UFMG). Editora da Revista Devires – Cinema e Humanidades; integra o comitê científico do Forumdoc.bh. É coordenadora do grupo de pesquisa Poéticas Femininas, Políticas Feminista (UFMG-Cnpq); Coordenadora do GT Estudos de Cinema, Fotografia e Audiovisual da COMPÓS (Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação); e co-coordenadora do ST Cinemas mundiais entre mulheres: feminismos contemporâneos em perspectiva da SOCINE (Sociedade Brasileira de Estudos de Cinema e Audiovisual). Introduziu e leciona a disciplina Cinema e Feminismo na graduação, e Estéticas Feministas Nothing Happens: Chantal Akerman’s Hyperrealist Everyday, de Ivone Margulies; autora de vários artigos que tratam o cinema numa abordagem feminista e capítulos nos livros: Feminismo no PPGCOM-UFMG (Linha de Pesquisa Pragmáticas da Imagem). Tradutora do livro e Plural: mulheres no cinema brasileiro; Corpo e Cultura Digital: diálogos interdisciplinares; Afectos, historia y cultura visual. Una aproximación (in)disciplinada; e Mulheres de Cinema.
Amanda Devulsky
Amanda Devulsky é cineasta e artista. Seus trabalhos foram exibidos no 30º Cinélatino Rencontres de Toulouse, 21º Festival de Cinema Luso-Brasileiro de Santa Maria da Feira, 22º Mostra de Cinema de Tiradentes, Besides The Screen International Conference, aarea.co, entre outros. É mestra em Processos Artísticos Contemporâneos pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro e, atualmente, pesquisa preservação de arquivo na Elías Querejeta Zine Eskola. Em 2015, integrou a criação do Verberenas, revista independente colaborativa focada em textos de mulheres realizadoras no Brasil, atuando desde então como editora-chefe e curadora.
​​​​​​​CURADORIA SESSÃO #3
No início dos anos 70, a jovem cineasta Tereza Trautman, de apenas 22 anos, escreve com a colaboração de Leila Diniz o roteiro de uma ficção deliciosa e revolucionária. Semanas após ter sido lançado comercialmente nos cinemas e muito bem recebido, o filme Os homens que eu tive é barrado pela censura da ditadura militar.

Ao retomar esse filme, pode chamar atenção que seja considerado o primeiro longa-metragem de ficção dirigido por uma mulher no cinema brasileiro moderno. Não basta que seja o primeiro, apesar do fato histórico. Para mim e para minhas companheiras de curadoria, Glênis Cardoso e Letícia Bispo, o filme se destaca pela rebeldia em apresentar uma protagonista que insiste em ser quem é de forma corajosa e, ao mesmo tempo, natural. 

É essa natureza solar, que remete ao coração e à verdade, que acredito tornar possível que o filme transite entre temas ainda hoje tomados como espinhosos – entre eles as relações poliamorosas, o sexo, a família, o amor através de perspectivas femininas – com o frescor de uma experiência que inspira e nunca impõe. 

O desejo no filme funciona assim, como um combustível das micropolíticas que recusam o conservadorismo, que compreendem a vida enquanto continuidade e fluxo. Em princípio, essa escolha curatorial propõe a valorização dessa capacidade de criação, do próprio tesão em viver, frente a contextos inveterados na esterilidade. É impressionante constatar que o filme foi feito em meio aos anos de terror do regime ditatorial. 

Olhar para o passado nos permite reelaborar o presente e entender nossa trajetória, tanto no sentido pessoal quanto coletivo. Valorizar esse gesto torna-se ainda mais fundamental quando assistimos à Cinemateca Brasileira – que conta com o maior acervo audiovisual da América do Sul – arder em chamas e seguir sem seu quadro de funcionários e sem repasses governamentais.

Se o presente é o futuro do passado, assistir a Os homens que eu tive permite sentir também que, apesar da censura, do que não querem que seja visto, do que não querem que seja lembrado e reelaborado, os gestos que foram engatilhados ali continuam acontecendo. 

É uma lembrança sobre a continuidade. Pity, a protagonista do filme, continua existindo. Tereza Trautman continua sua jornada enquanto cineasta e posteriormente cria um dos principais canais por assinatura voltado para o cinema brasileiro independente. Leila Diniz, apesar de ter falecido precocemente, continua causando com seus grandes papéis e a história de suas entrevistas e sua barriga de fora. Darlene Glória abandona a carreira de atriz por duas décadas para retornar no final dos anos 1990 em papéis na televisão e no cinema. A Cinemateca Brasileira, mesmo com uma fração do acervo perdido, permanece com parte de seu rico acervo necessitando de apoio e luta por sua conservação. O cinema brasileiro realizado por mulheres continua sendo feito. Os fios continuam sendo tecidos. Nós, todas nós, continuamos de alguma maneira ainda aqui.

Boa sessão a todas!
Amanda Devulsky